(Mário Quintana)

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sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Quebrando Pedras e Plantando Flores

© Walmir Lima
Cora Coralina


Meu Blog nunca esteve tão parado, mas espero que, mesmo ‘parado’, ele consiga proporcionar leitura, mesmo que antiga, para visitantes novos ou re-leitura nova para amigos antigos.

Até aí, nada de errado, mesmo porque, segundo dizem, ‘não existe nada de completamente errado no mundo; mesmo um relógio parado consegue estar certo duas vezes por dia’.

Em meio a tantas atribulações do meu dia-a-dia atual, entre um telefonema e outro, entre um e-mail e outro, encontrei um tempinho – meia horinha – para reler dois de seus poemas que, como tantos outros de Cora, são reveladores da essência e da alma dessa bela mulher e que me transportaram a um tempo em que eu andava inspirado, com um pouco mais de disposição e tempo - um tempo em que escrevi duas matérias (‘
Cora Coralina – A Casa de Pedra' e ‘Saber Viver’) sobre uma de minhas maiores escritoras, que só começou a publicar aos 75 anos de idade e a quem amo perdidamente: Cora Coralina.

Isso me deu vontade de escrever mais um pouco e fazer o ponteiro do relógio do O Centauro ‘pular’ mais um pontinho. Um pontinho com o valor do ouro - do ‘ouro’ contido nos poemas dela.

Conhecer o perfil de mulher traçado por Cora é percorrer o abismo profundo e misterioso das almas femininas, cheias de segredos e reservas próprias de quem tem a responsabilidade da continuidade.

Cora me encanta por sua simplicidade pessoal, pela doação de seus preciosos valores e costumes, pela simplicidade de sua alma generosa, tão transparente em seus textos, em trechos que gostaria de, aqui, compartilhar:


Todas as Vidas

Vive dentro de mim
Uma cabocla velha
De mau olhado,
Acocorada
Ao pé do borralho,
Olhando pra o fogo.

Vive dentro de mim
A lavadeira
Do Rio Vermelho
Seu cheiro gostoso
D’água e sabão.

Vive dentro de mim
A mulher cozinheira,
Pimenta e cebola,
Quitute bem feito.

Vive dentro de mim
A mulher proletária
Bem linguaruda,
Desabusada,
Sem preconceitos.

Vive dentro de mim
A mulher roceira,
Meio casmurra,
A mulher da vida,
Minha irmãzinha
Tão desprezada,
Tão murmurada.

Todas as vidas
Dentro de mim,
Na minha vida,
A vida mera
Das obscuras...


--o—0—o--

Das Pedras

Ajuntei todas as pedras
Que vieram sobre mim
Levantei uma escada
Muito alta
E no alto subi,
Teci um tapete floreado
E no sonho me perdi...

Uma estrada,
Um leito,
Uma casa,
Um companheiro.
Tudo de pedra...

Entre pedras cresceu
A minha poesia,
Minha vida...
Quebrando pedras
E plantando flores...

Entre pedras
Que me esmagavam
Levantei a pedra rude
Dos meus versos...


--o—0—o--


Na minha visão, o lirismo crítico e filosófico de Cora Coralina aflora da rude aridez da pedra, das tristezas e adversidades, de sua inquietude de viver numa época e contexto de anulação das realizações pessoais da mulher em favor do seu homem e da família.

E, como reflexo de sua doce tenacidade, seus versos fluem aveludando o tecido grosso que veste a realidade de suas experiências.

Cora Coralina... quebrando pedras e plantando flores.

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24 Comentários:

Blogger Flavio Ferrari disse...

Blog tá parado ? Bota carvão nele !

5 de dezembro de 2008 às 01:11  
Blogger Anne M. Moor disse...

"(...)
Ajuntei todas as pedras
Que vieram sobre mim
Levantei uma escada
Muito alta
E no alto subi,
Teci um tapete floreado
E no sonho me perdi...
(...)

Isso é saber viver e entender a alma própria e a dos outros. Êta mulher porreta essa! Também adoro.

Bjos

5 de dezembro de 2008 às 09:32  
Blogger Walmir Lima disse...

Flávio,

Meus navios que trazem carvão do Canadá e Australia também estão parados.

Vou 'acender a fogueira' com palavras mesmo.

5 de dezembro de 2008 às 10:35  
Blogger Jorge Lemos disse...

Uma especie rara, espécie em extinção. Paixão pela vida onde a simplicidade deve imperar para se fazer ouvir.
Linda postagem sobre a moça menina,
poeta porretaça, Cora Coralina.

5 de dezembro de 2008 às 10:54  
Blogger Walmir Lima disse...

Anne,

E pensar que essa grande poetisa e mulher de vida dura e persistente, que faleceu em 1985 aos 96 anos, aprendeu a usar a máquina de escrever aos 70 anos e só foi ter o seu primeiro livro publicado aos 75 anos de idade.

Põe 'porreta' nisso, ela é um maravilhoso exemplo de força e beleza que moram no interior de um ser humano - um patrimônio eterno da cultura - seu legado.

5 de dezembro de 2008 às 10:56  
Blogger Walmir Lima disse...

Jorge,

Você é outro, como ela, e sabe muito bem do eu estou falando.

Um abraço, amigo e mestre.

5 de dezembro de 2008 às 10:57  
Blogger Anne M. Moor disse...

O que nos mostra mais uma vez que nunca é tarde pra viver...

5 de dezembro de 2008 às 13:54  
Blogger A.Tapadinhas disse...

O Inferno, dizem, está cheio de boas intenções. Que se saiba, o Céu nunca se encheu com os bons exemplos...
Força na máquina!
Abraço.
António

7 de dezembro de 2008 às 09:34  
Blogger Udi disse...

Que bom compartilhar com a gente da tua leitura tão bacana! Uma forma de manter o blog "aceso".
beijos

7 de dezembro de 2008 às 14:57  
Blogger Walmir Lima disse...

António,

Obrigado pela força. Cora é um belo exemplo disso.

14 de dezembro de 2008 às 14:34  
Blogger Walmir Lima disse...

Udi,

E nunca é demais falar de alguém tão lindo e importante como ela.

Que bom que você também gosta.

14 de dezembro de 2008 às 14:36  
Blogger Ernesto Dias Jr. disse...

Se um dia eu ficar velho, que ser como a Cora.

16 de dezembro de 2008 às 00:26  
Blogger ana disse...

Boas Festas para você e Feliz Natal Walmir!!!
Un beijo Grandeeeeeeeeeeee.
ana

24 de dezembro de 2008 às 15:49  
Blogger Flavio Ferrari disse...

Wolta, Valmir ...
Feliz ano Novo.
Sorte, saúde e muito amor.

2 de janeiro de 2009 às 11:52  
Anonymous Anônimo disse...

Walmir
Estive bem doente. Aguardo noticias suas.
Feliz e próspero Ano Novo.

Jorge Lemos

3 de janeiro de 2009 às 10:26  
Blogger A.Tapadinhas disse...

Tenho aqui esta notícia do amigo Jorge Lemos, mas felizmente o tempo verbal está no passado: estive. Seu blog parou num dia muito especial para mim, 5 de Dezembro, dia dos meus anos. É um pretexto para lhe desejar um Feliz Ano 2009.
Abraço, amigo Walmir.
António

5 de janeiro de 2009 às 15:40  
Blogger Anne M. Moor disse...

Kd vc? Sumiu porquÊ? Porque sumiu?????

Abração

5 de janeiro de 2009 às 22:58  
Anonymous Anônimo disse...

Papito, que poema bonito...

A cora escreve com alegria sua vida de amélia e o melhor é que se orgulha disso com carinho !!!! Gosto de seus versos mesmo quando menciona em duras penas a felicidade em servir... mulheres assim "não existem mais", quando existem se escondem atras do feminimismo moderno de hj, afim de camuflar NOSSA dura realidade, que além de servir com alegria, marido, filhos, trabalho, administra o lar, faz dieta, malha horas na academia, se mantem antenada com o mundo e com todos. Ai que saudades dos tempos de amélia de cora, rsrsrs aparentemente menos aterefado, mais simples e menos servil!!!!

Bjo grande de sua filhota que te ama papitoooo

9 de janeiro de 2009 às 14:23  
Blogger Maria disse...

Tambem desaparecida volto e revejo Cora Coralina, me deu saudades. Andei parada arrumando as pedras.
Bjs

10 de janeiro de 2009 às 01:44  
Blogger Maria José Speglich disse...

Eu amo cora Coralina.

Parabéns! Seu blog é lindo.

26 de janeiro de 2009 às 07:36  
Blogger Walmir Lima disse...

Ana, Maria, Angela (filha querida), Ernesto, flávio e Jorge

Um beijo a todos pela visita.

27 de janeiro de 2009 às 19:55  
Blogger Walmir Lima disse...

Maria José,

Um obrigado especial pela primeira visita.

É gratificante constatar que ainda existem pessoas tão especiais que também admiram os nossos, não menos especiais, gênios da literatura, como Cora Coralina.

Um abraço,

Walmir

27 de janeiro de 2009 às 19:58  
Blogger Ƭ. disse...

amo cora coralina sob qualquer circunstância

cresci num ambiente literário, com meu pai sempre envolvido nos livros e minha mãe a me ensinar a cultivar o gosto pela leitura

até ser seletiva o suficiente e me envolver com cora coralina, cecília meirelles (algun poucos, mas preciosos) e por aí vai

em minha visita vespertina com vc me deparo logo neste post, onde se posiciona a respeito de "...nunca esteve tão parado" e logo em seguida chego a cora

nossa! vamos combinar que tem tudo a ver, não é mesmo?

mas...
preciso realmente deixar um comentário, do tipo, gostei, adorei, lindo!?

claro que não

o bom do blog é justamente isto, qdo seus autores nos proporcionam reflexão suficiente sobre suas publicações, originais ou não, não importa

e isto vc faz melhor que ninguém!

forte abç,

teresa

:)

ps:vou dar uma conferida em seus dois artigos sobre a cora coralina, mas duvido que seja algo mais surpreendente q este aqui.

12 de fevereiro de 2009 às 18:54  
Blogger Walmir Lima disse...

Oi, Teresa

Que bom ter tua visita.

Uma linha sobre Cora Coralina já me eletriza e surpreende.
Estive na casa dela e, lendo seus escritos, percebi a beleza maior dessa mulher.
A surpresa, você verá, é o que ela nos causa interiormente a cada vez que a lemos, e mesmo a cada vez que a re-lemos.
Ela me toca profundamente e, percebo que a você também.
Desfrute sem moderação.

12 de fevereiro de 2009 às 20:45  


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